Evandro Teixeira e o Fotojornalismo Brasileiro: Um Legado de Imagens e Resistência
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Evandro Teixeira é um dos maiores fotojornalistas brasileiros, inúmeras vezes premiado, é conhecido por suas imagens marcantes, quase sempre em preto e branco, que capturaram momentos cruciais da história do Brasil e do mundo por quase sete décadas. Sua trajetória é um exemplo de dedicação, talento e sensibilidade, deixando um legado inigualável na fotografia documental e jornalística.
Retrato do Evandro Teixeira, Rio de Janeiro, 2013. Foto de André Arruda/Divulgação
A Origem e Trajetória de Evandro Teixeira na Fotografia
Nascido em 1935 na cidade de Irajuba, no interior da Bahia, Evandro Teixeira demonstrou interesse pela fotografia desde jovem, inspirado pela câmera de seu tio Arcelino. Mudou-se para Jequié na década de 1950 para prosseguir seus estudos, onde iniciou sua jornada no jornalismo no Jornal de Jequié, também foi quando comprou sua primeira câmera, uma bem simples. Posteriormente, em Ipiaú, aprimorou suas habilidades fotográficas sob a tutela de Teotônio Rocha, primo do cineasta Glauber Rocha, trabalhando no Jornal Rio Novo. Logo compra sua segunda câmera, uma Polaroid.
Em 1954, transferiu-se para Salvador, onde realizou um curso de fotografia por correspondência com José Medeiros, através da revista O Cruzeiro, e estagiou no Diário de Notícias. Em 1957, Evandro chegou ao Rio de Janeiro, estagiando no Diário da Noite, do grupo Diários Associados, de Assis Chateaubriand. Inclusive, sua primeira função foi no setor de registros de casamentos.
Casamento, Paraty, Rio de Janeiro, 1969. Foto de Evandro Teixeira/Acervo IMS
A trajetória não foi simples, seus primeiros trabalhos tiveram alguns problemas: fotografou um casamento de uma alemã com um homem negro, mesmo com as orientações racistas do jornal; em outra chance, não chegou a tempo de fotografar o desfile de fantasias do Baile do Theatro Municipal. Mas, depois, teve sucesso no registro do desfile das escolas de samba e esse pode ser considerado o pontapé inicial do que viria a ser.
Seu talento e dedicação logo o destacaram, levando-o, em 1963, a aceitar integrar a equipe do Jornal do Brasil, uma das publicações mais influentes da época, que já havia negado uma vez por achar que era um local de elite e que não o cabia: “A fotografia era a elite do jornal. Para se ter uma ideia, no JB o fotógrafo ganhava mais que o repórter de texto. Você tinha liberdade de sair às ruas, se pautar, criar suas matérias e ensaios fotográficos, e tudo sem flash ou fotômetro. Flash era proibido no Jornal do Brasil.” - Evandro Teixeira em entrevista a Paulo César Boni.
Passista na avenida Presidente Vargas, Rio de Janeiro, 1973. Foto de Evandro Teixeira/Acervo IMS
Mas naquele ano, ele aceitou e foi onde permaneceu por 47 anos, até 2010, quando se demitiu depois de saber que teria que demitir oito dos dez fotógrafos da sua equipe e logo depois o jornal encerrou sua edição impressa.
Principais Trabalhos e Contribuições de Evandro Teixeira
Ao longo de sua carreira, Evandro Teixeira esteve presente em eventos históricos de grande relevância. Em 1964, esteve presente no Forte de Copacabana na madrugada do golpe militar e presenciou a chegada de Castello Branco, sua foto foi capa do jornal do dia seguinte e marca o início dessa fase política do país. Em 1968, registrou a "Passeata dos Cem Mil" no Rio de Janeiro, uma manifestação contra a ditadura militar, capturando imagens que se tornaram ícones da resistência estudantil.
“No período da ditadura era isso: prisões, pancadas e equipamentos quebrados ou apreendidos. Apanhei algumas vezes, fui preso outras vezes. Mas, felizmente, nunca apreenderam ou quebraram meus equipamentos”, disse Teixeira em entrevista.
Tomada do Forte de Copacabana, Rio de Janeiro, 1964. Foto de Evandro Teixeira/ Acervo IMS
Passeata dos Cem Mil, Cinelândia, Rio de Janeiro, 1968. Foto de Evandro Teixeira/Acervo IMS
Caça ao estudante, Sexta-feira Sangrenta, Rio de Janeiro, 1968. Foto de Evandro Teixeira/Acervo IMS
Cavalaria durante a missa do estudante Edson Luís, Candelária, Rio de Janeiro, 1968. Foto de Evandro Teixeira/Acervo IMS
Em 1973, esteve no Chile durante o golpe militar liderado por Augusto Pinochet, documentando o funeral do poeta Pablo Neruda, onde capturou a emoção e a tensão daquele momento histórico. Ele foi o único fotógrafo do mundo a conseguir ingressar no hospital onde estava o corpo do poeta. Sua abordagem discreta e sensível permitiu-lhe documentar momentos históricos com profundidade e autenticidade.
Além de sua atuação no fotojornalismo, Evandro dedicou-se a projetos autorais significativos. Em 1997, lançou o fotolivro "Canudos, 100 anos", no qual revisitou os cenários da Guerra de Canudos, oferecendo uma perspectiva contemporânea sobre o conflito que marcou o sertão nordestino. Sua obra não apenas documenta, mas também interpreta e contextualiza momentos históricos, proporcionando uma compreensão mais profunda dos eventos retratados.
Multidão acompanha o enterro do poeta Pablo Neruda, Cemitério Geral de Santiago, Chile, 1973. Foto de Evandro Teixeira/Acervo IMS
Além de seu trabalho político, Evandro Teixeira registrou figuras icônicas do século XX, como Pelé, Ayrton Senna, Leila Diniz, Cartola, Carlos Drummond de Andrade, Chico Buarque, Vinicius de Moraes e Tom Jobim.
As Falas Mais Marcantes de Evandro Teixeira
“Minha aventura pessoal identifica-se com a aventura vivida pelo mundo. Não tenho méritos por isso; sou um homem manejando uma câmara. Quando bem operada é um fósforo aceso na escuridão. Ilumina fatos nem sempre muito compreensíveis. Oferece lampejos, revela dores do impasse do mundo. E desperta nos homens o desejo de destruir esse impasse”. - Evandro Teixeira
Em 2023, em entrvista à LatAm Journalism Review, ele disse: “O que mais me ajudou na carreira foi a sorte, além da vontade de fazer o trabalho. Sempre acreditei que ia conseguir fazer as pautas darem certo, e nunca tive respeito pelos atos de loucura daqueles que mandam”.
Luiz Gonzaga, Teatro Opinião, Rio de Janeiro, 1972. Foto de Evandro Teixeira/Acervo IMS
Marcelo Ferrera e Torben Grael, Olimpíadas de Sidney, 2000. Foto de Evandro Teixeira/Acervo IMS
A piscadela do campeão Ayrton Senna, Rio de Janeiro, 1989. Foto de Evandro Teixeira/Acervo IMS
O Legado de Evandro Teixeira: Reconhecimento e Influência no Fotojornalismo
O trabalho de Evandro Teixeira transcende fronteiras, sendo reconhecido internacionalmente. Seu nome está incluído na Enciclopédia Suíça de Fotografia, uma honra concedida a poucos. No Brasil, recebeu elogios de figuras ilustres, incluindo o poeta Carlos Drummond de Andrade, que, no poema "Diante das fotos de Evandro Teixeira", destacou a fotografia como uma "arma de amor, de justiça e conhecimento".
Evandro deixou um legado significativo para a fotografia brasileira e mundial. Suas imagens são estudadas e admiradas por fotógrafos, historiadores e entusiastas da fotografia. Ao longo da carreira, publicou sete livros, como "Canudos 100 Anos" e "Fotojornalismo", que compilam parte de sua obra e oferecem insights sobre sua abordagem fotográfica.
Rainha Elizabeth II e Pelé, Estádio do Maracanã, Rio de Janeiro, 1968. Foto de Evandro Teixeira/Acervo IMS
Seu trabalho continua a inspirar novas gerações de fotógrafos, ressaltando a importância do olhar atento e da coragem para registrar a história em seus momentos decisivos. Para aqueles que desejam se aprofundar na obra de Evandro Teixeira, recomenda-se visitar exposições de suas fotografias e consultar suas publicações, que oferecem uma visão abrangente de sua contribuição para a arte e o jornalismo.
Seu vasto acervo, com mais de 150 mil imagens, foi doado ao Instituto Moreira Salles (IMS), que recentemente organizou uma exposição com suas fotografias feitas no Chile. E em 2022 o instituto lançou o site dedicado ao fotojornalismo, o Testemunha Ocular, e Evandro é um dos seis fotógrafos homenageados.
Clementina de Jesus e Cartola, Banda de Ipanema, Rio de Janeiro, 1968. Foto de Evandro Teixeira/Acervo IMS
Suas imagens continuam sendo estudadas e exibidas no Brasil e no exterior. Em 2008, ao lado de Sebastião Salgado, Teixeira foi um dos dois brasileiros selecionados para uma mostra na Leica Gallery, em Nova York, ao lado de 40 fotógrafos de renome mundial, como Henri Cartier-Bresson, Robert Capa e Marc Riboud.
Evandro Teixeira faleceu em 4 de novembro de 2024, no Rio de Janeiro, aos 88 anos, de falência múltipla de órgãos devido a complicações de uma pneumonia. Ele permanece como uma referência incontornável na fotografia documental, evidenciando o poder da imagem na construção da memória coletiva.
Já conhecia a história de Evandro Teixeira? Qual a foto mais marcante dele na sua opinião?
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